
Ato na Paulista em apoio a Che e contra Veja
O fiscal de renda aposentado Paulo Macambira, 55, andou pouco mais de meia hora da casa onde mora, na rua Augusta, região central de São Paulo, até a TV Gazeta, na avenida Paulista, aonde chegou às 12h05 da sexta-feira, 5. “Não leio Veja e não leio Clóvis Rossi”, conta. Afirma ter lido com muita atenção, contudo, o livro Che Guevara – a vida em vermelho, biografia do argentino revolucionário assinada por Jorge G. Castañeda.
Macambira esteve entre os participantes de um ato de protesto que percorreu a Paulista – do prédio da Gazeta até o vão do Museu de Arte de São Paulo (Masp) -, contra o conteúdo da reportagem feita pelos jornalistas Diogo Shelp e Duda Teixeira, sobre a vida de Ernesto Guevara, publicada em Veja no dia 3 de outubro. A revista procura mostrar Che não como um ícone da esquerda e sim como “um homem de carne e osso, com suas fraquezas, sua maníaca necessidade de matar pessoas.”
Ainda de acordo com a matéria, para os companheiros Che era apenas “el cancho”, o porco, porque não gostava de banho e “tinha cheiro de rim fervido”. Um outro trecho da reportagem conta que “por suas convicções ideológicas, Che tem seu lugar assegurado na mesma lata de lixo onde a história já arremessou há tempos outros teóricos e práticos do comunismo, como Lenin, Trotsky, Mao e Fidel Castro.”
A idéia de organizar o ato partiu do grupo Izquierda Unida. A arquiteta Lilian Vaz é secretária-geral da entidade e explica que a mobilização dos participantes do protesto se deu sobretudo através de e-mails. Em princípio, estava marcado para as 15h do sábado, 6, em frente ao Conjunto Nacional. A antecipação e a mudança de local foram decididos como forma de coincidir com um outro ato previamente agendado pelo Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes).
Propondo mudanças nos processos das concessões de rádio e TV no Brasil, o ato marcou o lançamento da campanha intitulada Concessões de Rádio e TV: quem manda é você e contou com o apoio de várias entidades, entre elas CUT, a UNE, a Articulação Mulher & Mídia, a Marcha Mundial das Mulheres, o Grito dos Excluídos, a Campanha pela Ética na TV, o Coletivo Epidemia.
A data (5 de outubro ) marcava o vencimento do prazo de importantes concessões de rádio e televisão aberta e, de acordo com o Intervozes, motivou protestos em 15 Estados, pedindo, dentre outros pontos, o fim da renovação automática e ações imediatas contra irregularidades no uso dessas concessões. O ato reuniu, estima a Polícia Militar, cerca de 100 pessoas.
Lilian Vaz explica que o Izquiera Unida, a exemplo do Intervozes e das outras entidades participantes do ato, “luta contra o golpe midiático e por uma mídia livre”. Ela não lê a Veja desde a década de 1980: “Lia no tempo do Mino Carta. Daí a parte de propaganda ficou maior que a das matérias e, naquela campanha contra o Lula e a favor do Collor foi que tive asco e horror à Veja por conta de seu direcionamento fascista e vendido.”
Gabriel Haddad, secretário de Comunicação, Informação e Pesquisa do Izquierda Unida, depois de ler a reportagem, escreveu um texto contestando ponto por ponto a matéria. Ele diz que Diogo Shelp, editor de Veja e co-autor da reportagem, sempre dá um jeito de incluir Cuba, invariavelmente de forma negativa, em suas matérias. E faz uma observação a respeito das fontes de Veja.
“Primeiro, eu não dou meu dinheiro para a editora Abril de jeito nenhum. Li a matéria pela internet. Curioso é que a revista cita fontes que não existem ou já morreram”, diz Haddad, que ressaltou o fato de o Izquierda Unida ter somado com o ato promovido pelo Intervozes. “Somos setenta pessoas espalhadas pelo Brasil e, de toda forma, isso acaba tornando o Izquierda Unida uma rede. Mas não teríamos força aqui em São Paulo para organizar um ato como este .”
Entre os manifestantes estava o deputado federal Ivan Valente, do PSOL, que, em seu discurso, pediu uma vaia para a Veja; sua colega de Câmara, Luiza Erundina (PSB/SP), que faz parte da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática do Legislativo, também esteve presente. No discurso, Valente disse: “A Veja fez uma peça ridícula quando quis transformar um lutador, um ícone da esquerda, que se desprendeu dos valores materiais, em que alguém que não tem idealismo.”
Luiza Erundina, por sua vez, defendeu mudanças no artigo 54 da Constituição de 1988, que, de acordo com ela, deixa brechas que permitem aos detentores de concessões de rádio e TV cometer irregularidades e desvios. Autora do requerimento que visa rever na Câmara o marco regulatório que disciplina essas concessões, a deputada classificou o modelo vigente como antidemocrático. “Não há qualquer tipo de controle social ou quanto à programação. Trata-se de um setor concentrado em seis famílias e isto tem que mudar.”
Ao chegar ao Masp, a passeata do Intervozes decidiu “esticar” o ato até o cruzamento da avenida Paulista com a rua Augusta, onde fica o prédio do grupo CBS – detentor de oito rádios FM em São Paulo, segundo o Coletivo Brasil de Comunicação Social. Ali, os participantes do ato soltaram bexigas com a inscrição Concessões de rádio e TV: quem manda é você, o lema da campanha.
Léo Arcoverde é jornalistau
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